GOVERNANTA PODE SER MEI?
- Comunello & Rohden
- 1 de jul. de 2021
- 3 min de leitura

A Folha de São Paulo desta semana publicou notícia onde o tema central era um anúncio publicado no Portal Emprega Brasil divulgando vaga para “governanta” para a qual, entre outros requisitos, exigia-se imunização contra o Covid com a vacina da Pfizer.
Não bastasse a problemática amplamente debatida nas redes sociais nas últimas semanas a respeito de uma possível discriminação consistente em preterir candidatos a emprego, não só em virtude de não terem recebido a imunização contra a Covid, mas também, daqueles que fizeram jus ao imunizante, em relação ao fabricante da vacina recebida, parece-nos que um detalhe passou despercebido dos comentários e artigos: que a contratação, segundo o anúncio, seria através de MEI.
A absurda situação abre também um espaço para, brevemente, compreendermos o que vem a ser o microempreendedor e o porquê da estranheza da intenção de contratação de governanta que desempenha funções de empregada doméstica através de MEI ser, aparentemente, ilegal.
MEI é a sigla utilizada para tratar do Microempreendedor Individual, figura criada com o objetivo de tirar os trabalhadores autônomos da informalidade possibilitando a inscrição no CNPJ com menor nível de burocracia e custo, a contribuição para a previdência, a redução da carga tributária e, inclusive, a contratação de funcionário. Para ser MEI são poucos os requisitos, basta a pessoa ser maior de 18 anos, não ser sócio ou dono de outra empresa, exercer atividade permitida pelo Anexo XI da Resolução CGSN nº 140/18 e ter faturamento de até R$ 6.750 por mês ou R$81.000 por ano. Inclusive, ser trabalhador formal e exercer atividade com vínculo empregatício e carteira assinada não é empecilho para ser MEI.
Sobre as governantas, para começar, o nome legalmente dado ao cargo não é definidor de seu regime jurídico. O que define o regime jurídico são as atividades a serem desempenhadas, carga horária, existência de subordinação, forma de prestação do trabalho (local e instrumentos para tanto, inclusive), entre outros. A Lei Complementar nº 150/2015, inclusive definiu que é empregado doméstico quem presta serviços de forma contínua, subordinada, onerosa e pessoal e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à família, no âmbito residencial destas, por mais de 2 (dois) dias por semana. A governanta, mesmo que assim denominada no anúncio de emprego ou mesmo no Contrato de Trabalho, se fizer serviços de Empregada Doméstica (babá ou diarista, guardadas as devidas proporções, se a forma de prestação de serviços for subordinada), por mais de 2 vezes por semana, não pode ser contratada através de MEI porque a natureza jurídica do vínculo não será de prestação de serviços de forma autônoma, mas sim, empregatícia, ou seja, entre empregador e empregado, decorrendo daí a necessidade de assinar carteira de trabalho para fins de formalização (ato facilitado com a criação do sistema E-Social) e do pagamento de cumprimento de todos os deveres previstos na legislação trabalhista.
Em uma analogia da figura da contratação de um profissional MEI com um planejamento tributário: ambos devem guardar relação com o propósito negocial sendo que, na contratação do MEI, o “propósito negocial” não pode ser somente deixar de pagar os encargos trabalhistas. Pode, então, empregada doméstica ou governanta, ser MEI? Até pode, desde que exerça sua atividade de forma autônoma, sem subordinação, até o limite de 2 (duas) vezes por semana. Tendo em mente o “propósito negocial” contratação: Pode ser que a trabalhadora considere vantajoso o regime de MEI caso queira trabalhar em múltiplas residências, sem subordinação, sem os descontos gerados pela relação empregatícia, podendo enviar em seu lugar funcionária devidamente contratada. Caso contrário, ficaria desnaturada a relação jurídica, que passaria a ser de emprego, com todas as consequências dela inerentes. Na dúvida, a palavra final ficará, como sempre, com o Poder Judiciário.
RENATA BARBOZA COMUNELLO
Advogada